{"id":7056,"date":"2022-09-12T16:38:15","date_gmt":"2022-09-12T19:38:15","guid":{"rendered":"https:\/\/www.maissauderevista.com.br\/?p=7056"},"modified":"2022-09-12T16:39:18","modified_gmt":"2022-09-12T19:39:18","slug":"david-nott-cirurgiao-de-guerra","status":"publish","type":"post","link":"https:\/\/www.maissauderevista.com.br\/saude-geral\/david-nott-cirurgiao-de-guerra\/","title":{"rendered":"David Nott – Cirurgi\u00e3o de Guerra"},"content":{"rendered":"

Conhe\u00e7a a hist\u00f3ria do m\u00e9dico David Nott, que viaja por regi\u00f5es de conflito para ensinar profissionais de sa\u00fade a salvarem vidas<\/span><\/i><\/p>\n

O que a paix\u00e3o pelo hobby de construir aeromodelos tem a ver com vidas sendo salvas ao redor do mundo?\u00a0<\/span><\/p>\n

A princ\u00edpio n\u00e3o muito, voc\u00ea deve estar pensando. Mas a verdade \u00e9 que essas duas coisas t\u00eam muita rela\u00e7\u00e3o. Pelo menos para um homem. O m\u00e9dico gal\u00eas David Nott.<\/span><\/p>\n

Ele atua cotidianamente como Cirurgi\u00e3o Vascular e Geral em hospitais de Londres, na Inglaterra. Seu status como consultor permite que ele tire uma licen\u00e7a n\u00e3o remunerada todos os anos com o intuito de ajudar ag\u00eancias como a Cruz Vermelha Internacional e M\u00e9dicos Sem Fronteiras.\u00a0<\/span><\/p>\n

O cen\u00e1rio \u00e9 que muda um pouco. Ficam de lado os bem equipados centros cir\u00fargicos brit\u00e2nicos e entram hospitais, espa\u00e7os de treinamento e at\u00e9 mesmo salas de jantar em zonas de conflito.\u00a0<\/span><\/p>\n

Em seu livro War Doctor: surgery in the front line<\/strong><\/a> (em tradu\u00e7\u00e3o livre \u201cM\u00e9dico de Guerra: cirurgia na linha de frente\u201d) ainda in\u00e9dito no Brasil, Nott relembra como a paix\u00e3o com montar avi\u00f5es de pl\u00e1stico, algo fomentado nele por seu av\u00f4, pode ter influenciado suas habilidades.<\/span><\/p>\n

“Eu amava faz\u00ea-los, pintando cada componente, deixando-os secar e colando na pr\u00f3xima pe\u00e7a. Eu imagino que esse foi um dos primeiros exemplos da destreza manual que me serviu t\u00e3o bem quando adulto”, recorda o cirurgi\u00e3o, que precisava de muita paci\u00eancia e dedica\u00e7\u00e3o para as pe\u00e7as complicadas.<\/span><\/p>\n

Guerra na Ucr\u00e2nia<\/h2>\n

Em fevereiro, os olhos do mundo se viraram mais uma vez a um novo conflito armado. Dessa vez, a R\u00fassia invadiu a Ucr\u00e2nia, originando uma guerra que se estende at\u00e9 hoje.<\/span><\/p>\n

Desde o come\u00e7o, muitas pessoas buscavam deixar a regi\u00e3o, sendo recebidos em v\u00e1rios outros pa\u00edses, como foi o caso do Brasil. Houveram, por\u00e9m, aqueles que propositadamente foram at\u00e9 o local conflituoso. Apesar de soar como loucura para a imensa maioria do mundo, o objetivo era nobre: ajudar. Esse tamb\u00e9m foi o caso de Nott.<\/a><\/span><\/p>\n

A primeira viagem foi em abril. “Eu comecei inicialmente em um hospital. Quando eles souberam o que eu poderia fazer, me pediram para ir a mais hospitais, e a partir da\u00ed come\u00e7ou a crescer como uma bola de neve”, conta o cirurgi\u00e3o, que tratou feridos com les\u00f5es nas pernas, bra\u00e7os, ombros e feridas de fragmenta\u00e7\u00e3o de bombas.<\/span><\/p>\n

Ao mesmo tempo que auxilia os pacientes que j\u00e1 sofreram ferimentos, Nott tamb\u00e9m ajuda a salvar as vidas dos que ainda v\u00e3o se machucar. Isso porque cada opera\u00e7\u00e3o \u00e9 acompanhada por m\u00e9dicos locais. O intuito \u00e9 ensin\u00e1-los a se preparar e ter condi\u00e7\u00f5es de operar com os recursos dispon\u00edveis.<\/span><\/p>\n

“Eu passei a minha primeira semana s\u00f3 operando e operando, fazendo o m\u00e1ximo que podia. Em determinado momento, eu tinha umas 14 ou 15 pessoas em uma sala de cirurgia, todos debru\u00e7ados, olhando o que eu estava fazendo. \u00c9 uma \u00f3tima maneira de ensinar. Eu me afastei e disse a eles onde fazer as incis\u00f5es”, recorda. Na oportunidade, Nott viajou por toda a Ucr\u00e2nia, passando por regi\u00f5es que haviam sido bombardeadas.<\/span><\/p>\n

Cirurgia por Skype<\/h2>\n

Mesmo depois de ter voltado a Inglaterra, continuou o trabalho de auxiliar m\u00e9dicos que estavam na guerra. Foi o caso de Oleksander<\/a>, que havia participado de uma das aulas presenciais uma semana antes.<\/span><\/p>\n

“Ele me viu reparar um ferimento bem grave de perna na Ucr\u00e2nia e assistiu os treinamentos em v\u00eddeo que fizemos l\u00e1. Mas agora Oleksander era um cirurgi\u00e3o-chefe e estava diante de uma les\u00e3o semelhante”, explica Nott. Assim, com aux\u00edlio do Skype, um programa de videochamadas, ele guiou o aluno durante uma cirurgia.<\/span><\/p>\n

Na a\u00e7\u00e3o, o m\u00e9dico ucraniano foi orientado em como utilizar um peda\u00e7o de pele da regi\u00e3o de tr\u00e1s do joelho para reparar e fechar a ferida em outra parte da perna. A causa do problema que levou aquele paciente \u00e0 mesa de cirurgia foi uma explos\u00e3o.<\/span><\/p>\n

O processo, apesar de n\u00e3o ser comum, teve \u00eaxito. “Eu estava bem nervoso, mas tudo correu bem gra\u00e7as ao David Nott. Ele nos mostrou como m\u00e9dicos comuns podem lutar na linha de frente”, comentou Oleksander ao site da funda\u00e7\u00e3o David Nott.<\/span><\/p>\n

\u00a0<\/span>Segunda viagem \u00e0 Ucr\u00e2nia<\/h2>\n

Durante a passagem de abril ficou claro que haveria a necessidade de retornar ao pa\u00eds do leste europeu. Assim, David Nott foi mais uma vez em dire\u00e7\u00e3o a guerra, dessa vez acompanhado pelos cirurgi\u00f5es Pete Mathew e Ammar Darwis.<\/a><\/span><\/p>\n

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David Nott, ao centro, conduz um treinamento com m\u00e9dicos locais durante a segunda passagem pela Ucr\u00e2nia em 2022 – Foto: David Nott Foundation<\/a>.<\/figcaption><\/figure>\n

A equipe j\u00e1 trabalhou junta em v\u00e1rias zonas de conflito na \u00faltima d\u00e9cada. Os companheiros nessa nova jornada tamb\u00e9m fazem parte do corpo m\u00e9dico que ajuda a Funda\u00e7\u00e3o David Nott a realizar seus treinamentos (Veja mais sobre a funda\u00e7\u00e3o no Box).<\/span><\/p>\n

Foram dois per\u00edodos intensivos de 3 dias de trabalhos nas cidades de Dnipro e Kharkiv. Cerca de 60 profissionais foram instru\u00eddos. A viagem foi realizada com apoio da UOSSM<\/a> (<\/span>Union of Medical Care and Relief Organizations<\/span><\/i>, ou Uni\u00e3o de Organiza\u00e7\u00f5es de Assist\u00eancia M\u00e9dica e Socorro, em tradu\u00e7\u00e3o livre), uma coaliz\u00e3o de ONGs da \u00e1rea de sa\u00fade e apoio humanit\u00e1rio.<\/span><\/p>\n

“Juntos, partimos da Pol\u00f4nia e chegamos ao nosso primeiro destino de treinamento, que parecia ser uma instala\u00e7\u00e3o de ensino em Dnipro. Nas paredes, havia fotos de estudantes felizes e sorridentes, uma diferen\u00e7a gritante para a realidade atual da Ucr\u00e2nia”, comenta Pete Mathew, ao recordar da viagem.<\/span><\/p>\n

Como tudo come\u00e7ou<\/h2>\n

Um pouso r\u00e1pido e turbulento, sair correndo do avi\u00e3o e pegar carona em um ve\u00edculo blindado, para ent\u00e3o trabalhar em um hospital que havia ficado conhecido como “Queijo Su\u00ed\u00e7o”, pela quantidade de buracos que havia na edifica\u00e7\u00e3o.\u00a0 \u00c9 assim que come\u00e7a a jornada de David Nott em sua primeira miss\u00e3o.<\/span><\/p>\n

O ano era 1993 e uma guerra civil tomava conta da regi\u00e3o onde era a antiga Iugosl\u00e1via. Ap\u00f3s se voluntariar no M\u00e9dicos Sem Fronteiras, o MSF, David chegou a Sarajevo, hoje capital da B\u00f3snia. Em seu livro, ele conta o que aconteceu quando o hospital foi atingido por uma bomba durante uma opera\u00e7\u00e3o.<\/span><\/p>\n

“O pr\u00e9dio inteiro tremeu, eu podia sentir meus p\u00e9s escorregarem no piso de ladrilhos que estava escorregadio de sangue, e instantaneamente tive o pensamento que a estrutura poderia desmoronar. E ent\u00e3o, de repente, segundos depois do impacto, tudo ficou escuro”, narra.<\/span><\/p>\n

Com o fornecimento de energia desligado, os aquecedores n\u00e3o funcionavam e a temperatura na sala de cirurgia ca\u00eda drasticamente no inverno europeu, o que era potencialmente mortal para o paciente.\u00a0<\/span><\/p>\n

Nesse meio tempo, sem conseguir enxergar seus colegas, Nott os chamava, mas n\u00e3o obtia resposta. O encarregado por trazer lamparinas e ligar os geradores auxiliares em casos de queda de energia tamb\u00e9m n\u00e3o chegou. O cirurgi\u00e3o sentia o paciente perder cada vez mais sangue.<\/span><\/p>\n

“Chamei a enfermeira e a assistente, mas minha voz ecoou na escurid\u00e3o. A \u00fanica coisa que eu podia sentir era a mar\u00e9 de umidade enquanto o sangue do rapaz deixava seu corpo. Eu podia sentir sua vida se esvaindo”, continua a narrativa de Nott. “Alguns minutos depois, as luzes come\u00e7aram a piscar e depois voltaram. Minha equipe de opera\u00e7\u00e3o tinha fugido para se proteger”.<\/span><\/p>\n

Inicia\u00e7\u00e3o<\/h3>\n

Esse foi o primeiro paciente que ele perdera em uma miss\u00e3o, algo que chamou depois de uma inicia\u00e7\u00e3o. O fato, tamb\u00e9m narrado em seu livro, o fez se sentir apenas como uma pequena engrenagem no maquin\u00e1rio da guerra.<\/span><\/p>\n

A B\u00f3snia foi a primeira parada, em uma jornada de quase 30 anos que passou por:<\/span><\/p>\n